por: José Roberto de Toledo
O encontro veio a público no começo de dezembro: quatro homens se reúnem na varanda de um palácio para falar de dinheiro. De um lado, um diretor e o dono de empreiteira famosa por estruturar um departamento de corrupção. De outro, o vice-presidente da República e seu braço direito. Estes pedem, os outros dão: R$ 10 milhões. Se o fato é conhecido, as versões dos anfitriões sobre ele vêm se adaptando a cada nova revelação dos envolvidos.
A princípio, nem Michel Temer nem Eliseu Padilha admitiram terem se encontrado com Marcelo Odebrecht e Claudio Melo Filho no Palácio do Jaburu, onde morava o então vice, para falar de doação para o PMDB durante a campanha eleitoral de 2014. Ambos repudiaram em notas as “falsas acusações” e “mentiras”.
Não admitiram o encontro, mas tampouco negaram. Em sua nota de 9 de dezembro, Temer afirmava que as doações feitas pela Odebrecht ao PMDB foram “todas por transferência bancária”, e que não houve caixa 2 nem entrega de dinheiro a seu pedido. Só. Padilha disse que nunca tratou de arrecadação com quem quer que seja. Os outros protagonistas têm contado história diferente.
Temer e Padilha se referiam ao trecho da delação do diretor Melo Filho que diz que parte do dinheiro prometido pela Odebrecht no Jaburu foi entregue no escritório paulistano de José Yunes. Amigo de Temer desde a faculdade de Direito, Yunes foi nomeado assessor especial da Presidência em julho de 2016, mas deixou o cargo logo após a doação odebrechtiana vir a público.
Dias depois de suas notas indignadas, tanto Temer quanto Padilha passaram a admitir ter havido o encontro dos quatro homens no Jaburu. Insistiam, porém, que era tudo dinheiro declarado.
Essa versão começou a furar quando o Estado noticiou que quem entregara o dinheiro no escritório de Yunes havia sido Lúcio Funaro, um operador preso pela Lava Jato sob acusação de extorquir empresas junto com Eduardo Cunha. Segundo a notícia, Funaro entregara R$ 1 milhão em espécie ao amigo de Temer.
Em depoimento voluntário ao Ministério Público pouco antes do Carnaval, Yunes confirmou ter atendido pedido de Padilha – que viria a ser nomeado por Temer ministro-chefe da Casa Civil – para receber “um documento” em 2014. O amigo do presidente disse não saber o que havia no pacote mas que foi “mula involuntário do Padilha” – em alusão a quem carrega drogas para traficantes.
Yunes relatou que, ao entregar-lhe a encomenda, Funaro contou que estavam trabalhando para financiar 140 deputados a fim de eleger Eduardo Cunha presidente da Câmara em 2015. Como se sabe, Cunha foi eleito e teve papel-chave no processo que levou Temer à Presidência, e Padilha, de volta ao ministério.
Por vias tortas, o próprio Cunha demostrou conhecer a história. Arrolou Temer como sua testemunha de defesa e perguntou-lhe, por escrito: “Qual a relação de Vossa Excelência com o senhor José Yunes? O senhor José Yunes recebeu alguma contribuição de campanha para alguma eleição de Vossa Excelência ou do PMDB?”
Para sua sorte, Temer não se comprometeu com uma resposta. Foi uma das 21 perguntas que o juiz Sergio Moro achou sem pertinência ou inapropriada e não remeteu ao presidente.
O que se deduz – pelas questões de Cunha e, principalmente, pela delação do empreiteiro confirmada por Yunes – é que nem toda doação da Odebrecht para o PMDB de Temer e Padilha foi pela declarada via bancária. Parte usou mulas. Por qual motivo?
Se a Justiça eleitoral descobrir, vai demorar. Padilha está hospitalizado. Temer pode alegar ignorância, arrolar testemunhas, postergar o julgamento. Enquanto isso, o governo tenta aprovar as reformas, aquecer a economia e ficar popular.