por: Jânio de Freitas

Apesar de menos escandalosa, a prisão do banqueiro André Esteves é tão ou mais importante, em vários aspectos, do que a prisão do senador Delcídio do Amaral. Até agora, as empreiteiras e um ou outro fornecedor da Petrobras compunham a imagem dos grandes patrocinadores da corrupção. A entrada em cena de um poderoso banqueiro necessitado de silenciar um delator não é a “ponta de um iceberg”: é um grão no terreno arenoso da corrupção brasileira em sua verdadeira extensão.

As relações capitalistas adotam predominantemente, no Brasil, procedimentos à margem da lei e da ética. Qualquer que seja o setor de atividade, é inexpressiva a parcela que não se vale, com permanência, de vantagens ilegais. A verdade mais brasileira é que são práticas comuns a sonegação, a fraude, caixa dois, adulterações, produtos irregulares, e a corrupção com subornos que evitam fiscalizações e apagam multas, ou, no outro extremo, asseguram negócios, preços assaltantes e contratações ilícitas.

No setor financeiro, as manobras irregulares de especulação são o mais regular. Agora mesmo começa a despontar um caso gravíssimo de manobras cambiais de bancos dos Estados Unidos, ou sobretudo destes, inclusive com a moeda brasileira. O Banco Central tem muito a dizer a respeito, e o dever de dizê-lo, mas faz papel de espectador desinteressado. Trata-se, no entanto, de corrupção em altos bilhões.

A menção a André Esteves na reunião com Delcídio do Amaral, para salvarem-se ambos do perigo personificado por Nestor Cerveró, é só um flash das relações capitalistas no Brasil. Personagem de prestígio aqui e no exterior, André Esteves é conhecido também como abastecedor financeiro de alguns políticos, não só em campanhas eleitorais. O poder político é um dos seus negócios.

O pasmo causado pelo novo passo da Lava Jato não decorreu da prisão, sem precedentes, de um senador em exercício do mandato. Estão no Senado outras presenças a atestar que não há motivo para tamanho estarrecimento com a busca de um senador pela Polícia Federal. O espantoso veio sobretudo de ser Delcídio do Amaral, embora já estivesse citado em vazamento antigo da Lava Jato. Mas, parlamentar eficiente e bem conceituado mesmo pela oposição ao PT e ao governo, inclusive como negociador, Delcídio do Amaral figuraria em toda lista dos bons senadores.

O que o sereno Delcídio pretendeu, com André Esteves, foi livrar-se da acusação de um crime por meio de outro. Mas a falta de percepção com que o imaginaram diz mal de ambos. Era lógico que, à fuga de Nestor Cerveró desejada pelo parlamentar e pelo banqueiro, a família preferiria a delação premiada de seu chefe, para com ele gozar, pelo resto da vida, o saldo de riqueza que o acordo de delação deixa ao delator.

Fosse a fuga de perseguido político, aqui não poderia haver comentário reprovador. Auxílio à fuga de corrupto, por si mesma inaceitável, agrava-se porque os próprios Delcídio e Esteves seriam beneficiados, livrando-se, sem fugir, de acusações a que estavam sujeitos. Seu plano vale como uma confissão de culpa.

Por mais que os trombadinhas do impeachment explorem contra o governo a prisão de Delcídio do Amaral –houve até quem dissesse que agora a Lava Jato “caiu dentro do gabinete da presidente Dilma”– o efeito de fato é a perda do líder hábil da bancada governista no Senado. Tudo o que compromete Delcídio é estritamente pessoal. No mais, as coisas seguirão, com as mesmas dificuldades e as mesmas urgências.