Apoio no segundo turno fez ex-presidente se desentender com a sigla
Um dos fundadores do PSB, Roberto Amaral não conseguiu se manter na presidência do partido após a morte de Eduardo Campos e acabou afastado da Executiva Nacional da legenda. Em entrevista ao Broadcast Político, serviço de notícias em tempo real da Agência Estado, ele disse que nunca pensou e nem pensa sair da legenda.
“Isso seria entregar a história do partido. Meu compromisso não é com os atuais dirigentes, mas com os fundadores”, disse Amaral ao lembrar os nomes de Jamil Haddad e Miguel Arraes.
Amaral diz que pensa em lutar pelo partido. “Vou tentar até o último momento conservar meu partido — e encho a boca no ‘meu’ — no campo da esquerda.” O ex-presidente do PSB admitiu ser hoje parte de uma força minoritária no partido, mas defendeu sua representatividade. Ele argumentou que a defesa da “ideologia esquerdista” está nos diretórios do Rio de Janeiro, da Bahia, da Paraíba, de Alagoas e do Amapá, além de ser defendida pela maior parte da bancada no Senado, pela juventude e pelo movimento sindical da legenda. “Vou conversar com as bases do partido, vamos fazer um trabalho de baixo para cima, na contramão do que eles fazem”, afirmou. “Sou o único fundador do partido vivo, estou aqui porque tenho história, enquanto tem gente que chegou agora e está correndo para pegar o bonde.”
O ex-presidente se desentendeu com o grupo que hoje está na Executiva após a decisão do partido de apoiar a candidatura de Aécio Neves (PSDB) no segundo turno da eleição presidencial. Desde a morte trágica de Campos, no meio da campanha, o grupo considerado mais à direita dentro do PSB, entre eles o deputado federal Beto Albuquerque (RS), o presidente do PSB em Minas, Júlio Delgado, e a ala pernambucana — Sileno Guedes, presidente do PSB-PE, Paulo Câmara, governador eleito, e Geraldo Júlio, prefeito de Recife — ganharam projeção. Ao lado do PSB paulista, que é aliado do PSDB, esse grupo liderou o movimento pelo apoio a Aécio.
Amaral chegou a gravar depoimento para a campanha de Dilma Rousseff (PT) em desagravo à decisão do PSB de apoiar o candidato tucano. Albuquerque e Delgado criticaram o antigo dirigente dizendo que ele deveria tomar a iniciativa de deixar o PSB — como Amaral é fundador, não partiria da legenda a iniciativa de pedir seu desligamento.
Se antes Amaral media palavras, após a troca de farpas com os atuais integrantes da Executiva, ele hoje fala abertamente que o partido seguiu um caminho errado desde que Eduardo Campos deixou o governo e passou a defender teses econômicas ortodoxas, como o tripé macroeconômico e a independência do Banco Central. “A história recente mostra o fracasso rotundo do neoliberalismo. Ou será que o que vimos em 2008 é ficção? Ou será que a explosão do Oriente é uma novela?”, disse em referência à crise econômica internacional e aos levantes no Oriente médio e no norte da África.
Amaral, que foi ministro do governo Lula e sempre mais alinhado ao PT, acredita que a posição mais adequada à legenda seria a independência, já que um realinhamento com a base governista não seria aceito pela maioria. “Tenho a impressão que o partido vai tomar posição de independência, é o mínimo que se pode esperar.” Apesar da proximidade com o PT, Amaral diz que a imprensa tem uma visão distorcida da sua relação com a legenda de Lula. Ele afirma que a aproximação é ideológica. “Não discuto participar do governo, discuto a linha programática.”
Gravação
Amaral disse ter gravado para o programa eleitoral da campanha à reeleição de Dilma Rousseff “com muito orgulho”. Questionado sobre ter desrespeitado a legislação eleitoral com a participação, já que é filiado a um partido que declarou apoio a Aécio Neves, Amaral disse não ter certeza da ilegalidade. “Acho que não estava ferindo a lei eleitoral porque a decisão não estava formalizada com o TSE (Tribunal Superior Eleitoral)”, disse. “Mas mesmo se tivesse consciência (da ilegalidade da gravação), faria mesmo assim, porque é fundamental apoiar o espaço da esquerda. É uma questão ideológica”, justificou.
O ex-presidente do PSB disse que a visita que fez a Dilma antes do segundo turno foi cordial. “Ela respeitou muito o processo. Eles respeitaram admiravelmente todo processo durante essa crise (do PSB).” Amaral disse ter sido procurado pelo ministro de Relações Institucionais, Ricardo Berzoini, para marcar o encontro. “Conversamos sobre a campanha, sobre nossas experiências no governo Lula”, comentou sobre a reunião com Dilma.
Manifestações
Para Amaral, as manifestações de rua que aconteceram pelo País no fim de semana são mais um motivo para o PSB voltar às suas origens e se afastar do PSDB. “Desde a fundação, o parido aprofundou sua opção pelas massas e pelo nacionalismo. Apoiar Aécio já naquela ocasião foi dizer não a tudo isso. Agora, com essas manifestações, não há mais justificativa, o rei está nu.”
O ex-dirigente chamou as manifestações, que defenderam o impeachment de Dilma e até uma intervenção militar, de “pró-fascistas”, com incentivo ao ódio e à xenofobia. Ele argumenta que, ainda que a cúpula do PSDB negue envolvimento com os atos, há indícios de participação da base tucana, além de ter havido o pedido de auditoria da eleição. “O ponto de partida dessas movimentações foi o ingresso do PSDB pedindo a recontagem do pleito, o PSDB deixou sua digital. Mas também isso não me interessa, é irrelevante. O que me interessa é que a massa dele (Aécio) foi conquistada por esse discurso, é o eco da campanha dele.”