Reunidos na Fundação Escola de Sociologia e Política de São Paulo, nós, cidadãos das mais diversas visões políticas, representantes de instituições da sociedade civil e de entidades sindicais e empresariais, unificados pela preocupação comum em relação aos destinos do país em momento tão grave de sua história, externamos nossos pontos de vista sobre alguns dos temas mais urgentes da atual conjuntura.
Desde abril último, presenciamos a imposição de um programa de ruptura do pacto social brasileiro, estabelecido pela Constituição de 1988. Por mais que tentem aprová-lo a toque de caixa no Congresso Nacional, salta aos olhos que tal programa não fez parte de qualquer candidatura vitoriosa nas eleições de 2014: nem para o Poder Executivo, nem para o Poder Legislativo. Sendo um governo transitório, falta-lhe, pois, norte, tempo e popularidade para implementar as mudanças de fato exigidas pelo país.
- Impõe-se defender a democracia e, sobretudo, as eleições de 2018, para impedir quaisquer formas de perseguição política, cerceamento da liberdade de opinião ou mudança no regime político e no sistema de governo que não passe pelo crivo das urnas.
- A empresa nacional, a reindustrialização do Brasil e o investimento em ciência e tecnologia devem ser defendidos por qualquer governo comprometido com o desenvolvimento nacional.
- A política econômica vigente, de interesse exclusivo do mercado financeiro rentista, nacional e internacional, é responsável pela escalada do desemprego. Leva angústia e desespero a milhões de pessoas, e coloca em risco a estabilidade social. Neste quadro, é insensato propor reformas que têm como objetivo suprimir direitos sociais e trabalhistas conquistados há décadas. Elas não reformam a casa dos brasileiros. Derrubam seus alicerces.
- Juros exorbitantes, câmbio apreciado, fragilização deliberada da Petrobrás, justamente quando a companhia descobriu a maior reserva de petróleo do planeta dos últimos 30 anos, abandono da política de conteúdo local que possibilitou a industrialização acelerada do país a partir dos anos 50 do século passado, desconstrução do BNDES, essencial como indutor do desenvolvimento, tudo isso configura um cenário que, se não for revertido, nos remeterá ao passado.
- A terceirização, se irrestrita e ilimitada, poderá representar a eliminação de direitos trabalhistas para a parcela mais vulnerável da população brasileira e o rebaixamento dos padrões de civilização e justiça do nosso pacto social.
- As mudanças na previdência não podem inviabilizar a aposentadoria de parte substancial da população brasileira e destruir a solidariedade entre gerações, classes sociais e regiões do país.
- Ao invés de encarecer o crédito público direcionado para o investimento, excedendo em muito os padrões internacionais que asseguram a integração global competitiva, é preciso trazer a taxa de juros básica para patamares minimamente compatíveis com a média internacional e com a rentabilidade da atividade produtiva e de projetos de infraestrutura, sem o que será difícil e caro evitar a valorização cambial do Real.
- Sem taxa de câmbio competitiva, nossa desindustrialização será aprofundada. O real valorizado inviabiliza investimentos nacionais de longo-prazo e intensifica a transferencia de empregos para o exterior.
- O rebaixamento do investimento público deve ser revertido. As exigências de conteúdo tecnológico nacional, em função de seu potencial indutor do investimento privado local devem ser mantidas.
- Os bancos públicos têm um papel importante no financiamento do investimento privado e na geração de empregos, papel esse que não pode ser prejudicado pela eliminação ou grande encarecimento de suas fontes de recursos, aumentando juros e inviabilizando inversões de maiores risco, prazo e conteúdo tecnológico.
Está claro o propósito da atual política econômica, de estabelecer para o Brasil nas próximas décadas o rumo da subserviência ao estrangeiro, da exclusão social, do desprezo à cidadania e à democracia, em contraposição ao Brasil que almejamos, democrático, soberano, economicamente desenvolvido e socialmente inclusivo.
Nossa democracia não pode ser atropelada por um processo demasiadamente célere de mudanças nos estatutos legais que regulam nosso pacto social, retirando direitos fundamentais. A pressa é inimiga da legitimidade porque visa bloquear o debate público e, particularmente, tolher a participação dos maiores afetados por essas reformas.
Vivemos um momento delicadíssimo. Nosso país, uma das 10 maiores economias do mundo, não pode se apequenar. Urge resistir ao desmonte em curso, do Estado, da economia e da política. É este o nosso compromisso.
São Paulo, 22 de março de 2017
Aldo Fornazieri (Cientista Político, FESPSP).
Angelo Del Vecchio (Sociólogo).
Antonio Correa de Lacerda (Economista, PUC-SP)
Artur Araujo (Consultor da Federação Nacional dos Engenheiros).
Cesar Prata (Vice-Presidente da ABIMAQ).
Clemente Ganz Lucio (Diretor Técnico do DIEESE).
Clovis Francisco Nascimento Filho (Senge-RJ, Fisenge).
Ennio Candoti (Físico, ex-presidente da SBPC e atual Diretor do Museu da Amazônia).
Franklin Martins (Jornalista, ex-ministro da Secretaria de Comunicação Social).
Gilberto Bercovicci (Direito, USP).
Guilherme Estrella (Geólogo, ex-Diretor da Petrobrás).
Helio Campos (Jornalista, Revista Brasileiros).
João Antonio Moraes (Federação Única dos Petroleiros-FUP).
João Guilherme Vargas Netto (Consultor Sindical).
Ladislau Dowbor (Economista, PUC-SP).
Lais da Costa Manso (Socióloga)
Luiz Carlos Bresser-Pereira (Ex-Ministro da Fazenda, FGV).
Manuel Domingos Neto (Universidade Federal do Ceará).
Márcio Pochmann (Economista, UNICAMP).
Mario Scheffer (Médico, FMUSP e Vice-Presidente da ABRASCO).
Murilo Celso de Campos Pinheiro (Presidente da FNE).
Olimpio Alves dos Santos (Senge-RJ e Fisenge).
Otavio Velho (Antropólogo, UFRJ).
Pedro Celestino Pereira (Presidente do Clube de Engenharia-RJ).
Pedro Paulo Zahluth Bastos (Economista, UNICAMP).
Roberto Amaral (ex-Ministro da Ciência e Tecnologia).
Rodrigo de Morais (Sindicato dos Metalúrgicos de SP).
Samuel Pinheiro Guimarães (ex-ministro chefe da Secretaria de Assuntos Estratégicos).
Saturnino Braga (Presidente do Centro Internacional Celso Furtado).
Ubiratan de Paula Santos (Médico e Conselheiro da FESPSP).
William Nozaki (FESPSP e coordenador da Cátedra Celso Furtado).