por: J. Carlos de Assis*

Se eu seguisse a velha máxima segundo a qual o inimigo de meu inimigo é meu amigo celebraria com grande entusiasmo a nota que acaba de divulgar a Ajude-Associação dos Juízes Federais do Brasil. Nela, a entidade fulmina com a PEC-241, aprovada na Câmara, e que se tornou PEC-55 no Senado. A linguagem é particularmente dura. Os juízes não fazem por menos, mostrando a inconsequência da PEC. Só tem um pequeno problema: eles tratam o tema a partir exclusivamente de seus interesses corporativos, não do Brasil.

É uma obra prima de egoísmo desses juízes, que sequer disfarçam sua volúpia salarial. A PEC-55, ou a PEC do Estado mínimo, condena o Brasil a uma depressão permanente por nada menos que vinte anos. Claro que isso não vai acontecer porque não é razoável esperar que o país venha a ser governado nas próximas duas décadas por gente da estirpe de Michel Temer e Henrique Meirelles. Entretanto, como se trata de emenda constitucional, não se pode eliminar de saída o mal que a lei proposta venha a provocar, se aprovada, até ser revogada.

O fato é que é uma desmoralização para qualquer pessoa que tem espírito público contar entre seus aliados esses juízes federais. Muito partido político nessas eleições perdeu credibilidade por conta dos aliados que escolheu. Outros ainda vão perdeu no futuro. Felizmente, tudo indica que não será necessário o apoio da Ajufe para derrotar a PEC-55. Raras vezes tenho visto um movimento tão unânime na opinião pública contra uma proposta legislativa. Estou convencido de que os senadores levarão isso em consideração.

Alguns deles levarão em conta também os próprios e legítimos interesses na condição de pretendentes a governar seus estados daqui a dois anos. É que a PEC-55, se aprovada, teria consequências desastrosas para a administração e a economia dos estados. Assim, não é porque tira a perspectiva de aumentos salariais para o Judiciário que ela é prejudicial para o país, conforme reclama a Ajufe. É porque esmaga todo o setor público e, em especial, os gastos sociais que interessam sobretudo aos pobres, não aos juízes.

É sintomático do caráter corporativo da Ajufe seu comportamento no recente episódio em que um “juizeco” de primeira instância teve o atrevimento de violar o princípio da separação entre os poderes e mandar prender guardas legislativos no próprio Congresso, a pretexto – sempre ela – de obstrução da Lava Jato. À reação serena e altiva do senador Renan Calheiros, presidente do Senado, condenando o atentado contra a instituição, a Ajufe soltou uma nota impertinente de solidariedade ao violador da norma constitucional.

A Ajufe deveria tomar vergonha na cara porque esta não é a primeira vez que se apresenta como um grupo interessado mais nos próprios salários do que com as condições da Justiça no Brasil. Se seguisse a máxima mencionada acima teria aplaudido o então presidente do Supremo, Joaquim Barbosa, quando deu aos representantes da Ajufe uma descompostura pública, televisionada, por conta de seu corporativismo. Não me abalei em aplaudir Barbosa na ocasião. Foi a meu juízo um ministro parcial e discriminatório no julgamento do mensalão. Voltando à PEC, trataremos dela, em nome do interesse geral, num seminário na UnB, em Brasília, no próximo dia 3.

*Economista, professor, doutor pela Coppe/UFRJ.