As crises em que o Partido dos Trabalhadores esteve envolvido na última década podem ser uma oportunidade de analisar qual foi o grau de responsabilidade de suas direções nesse processo que o levou a enorme perda de credibilidade, oportunidade de rever prioridades e métodos de ação política.

Agir como se nada houvesse ocorrido, responsabilizar terceiros e dizer que no Brasil a política sempre foi assim não nos credencia a cumprir algum papel relevante no período próximo do ponto de vista de um projeto de esquerda que se mostre consistente para o desenvolvimento sustentável, objetivando inclusão social e ampliação dos direitos de cidadania no Brasil.

Contando hoje com quase 1,8 milhões de filiados, não é justo que a crítica ao partido recaia sobre esse conjunto, uma vez que embora o PT tenha avançado em termos de democracia partidária, rompendo com a cultura autoritária, machista e excludente dos partidos conservadores e de direita, isso se mostrou insuficiente para afirmar seu caráter de partido socialista, radicalmente democrático em seus processos decisórios.

Somos obrigados crescentemente a responder sobre o porquê de decisões que se mostraram equivocadas e destoantes dos nossos princípios, programas, estatuto e código de ética. Entretanto, delas não participamos e de muitas sequer tomamos conhecimento por iniciativa de nossas direções partidárias.

Em agosto de 2015, quando a crise não tinha contornos tão dramáticos, Lula, nosso presidente de honra, convidou os deputados estaduais do PT em São Paulo para um debate sobre os determinantes de uma crise cuja extensão e gravidade não conhecíamos em profundidade naquele momento, embora as intuíssemos pelos fatos levados ao conhecimento público pelos órgãos de controle externo e pela mídia conservadora.

Na oportunidade, colocou como premissas da discussão: total sinceridade nas falas; considerar o fato de que nenhum dirigente partidário havia solicitado reunião desse tipo para reconhecer erros cometidos, que não estamos na vida pública para acumular patrimônio e que não há ninguém no partido que esteja acima e seja mais importante do que o nosso projeto político-partidário, de transformação da sociedade brasileira.

Hoje, diante da gravidade dos fatos denunciados, nos perguntamos se essas premissas continuam válidas e se estamos dispostos a associar a luta para que Dilma Rousseff conclua o mandato conquistado pelo voto popular – luta unitária do campo democrático em defesa do Estado de Direito -, ao desafio de afirmar cada vez mais o PT como um importante partido socialista, democrático e de massas, renovado em suas direções, nos seus métodos de decisão e prioridades de ação política.

O desafio de estimular estudos, debates e contraposição de ideias, maior participação dos jovens e filiados em geral na produção de políticas e sua maior presença no cotidiano das lutas sociais – resgatando a importância das modalidades de democracia direta e participativa – passa pela superação do PED (Processo de Eleições Diretas), por reconhecer erros cometidos e destravar o debate desde já.

Teremos humildade suficiente para fazer isso internamente ao PT, sempre dialogando com a sociedade? Vamos colocar nossa relação com outras agremiações de esquerda e os movimentos sociais em outro patamar de exigência e respeito? Vamos dar prioridade à luta pela democratização dos meios de comunicação, valorizar a mídia alternativa, superar a nossa prática atual que segue monopolizada pela democracia representativa e pela prioridade dada à ocupação de espaços institucionais?

Conseguiremos colocar a construção de um projeto político de esquerda para o país acima dos nossos egos e interesses particulares ou de grupos? Só o tempo dirá se conseguiremos, mas enquanto isso não ocorre coletivamente nosso mandato vem tentando fazer sua parte ao promover debates com lideranças de esquerda no PT e fora dele, ao agir para fortalecer a organização autônoma dos movimentos sociais nas cidades e no campo e incentivar a formação de novas lideranças socialistas.

Carlos Neder, deputado estadual (PT/SP)