Há muito se anuncia que Lula é o real alvo da Operação Lava Jato. Na última sexta (4) realizou-se a profecia. Escolhido o criminoso, foi preciso encontrar o crime. A devassa na vida familiar do ex-presidente, na de seus familiares e colaboradores e a condução coercitiva foram as formas eleitas para tal desfecho.
Surpreendeu a todos que zelam pelo Estado democrático de Direito a decisão proferida pelo juiz Sergio Moro, a pedido dos integrantes da Lava Jato. Nem mesmo o fato de a operação já ter emitido 117 mandados de condução coercitiva (condução compulsória por agentes policiais) tem o condão de legitimar a ilegalidade agora praticada.
No presente caso, sem a existência dos requisitos legais, o juiz autorizou, além da condução coercitiva, a realização de busca e apreensão em residências e escritórios. Moro ancorou a medida, de forma inusitada, na necessidade de garantir a própria segurança do depoente e “evitar possíveis tumultos”.
Registra-se que, na mesma semana, o Tribunal de Justiça de São Paulo havia concedido liminar reconhecendo a impossibilidade da condução coercitiva anunciada pelo promotor de Justiça Cassio Roberto Conserino, decisão que, sem dúvida, é parâmetro para confirmar a ilegalidade autorizada por Moro, da 13ª Vara Federal de Curitiba.
Ilustres juristas e representantes dos tribunais superiores manifestaram espontânea indignação.
A ilegalidade se estendeu a cada detalhe da operação. Fotos tiradas de dependências íntimas de familiares de Lula acabaram nas revistas sensacionalistas costumeiras.
No Instituto Lula, os agentes que cumpriram o mandado de busca e apreensão levaram as senhas de acesso a todos os e-mails, embora não houvesse mandado judicial com essa amplitude. Foi arrombada uma porta no interior do estabelecimento, a despeito da informação de que chaves estavam prestes a chegar.
Filhos do ex-presidente também foram alvos de abusos. Policiais invadiram a residência de Luis Cláudio Lula da Silva e apreenderam documentos e objetos nas sedes das empresas LFT e Touchdown, de sua propriedade, com base em mandado emitido contra empresa diversa estabelecida em outro endereço.
Na garagem do apartamento de Fábio Lula da Silva, agentes fotografaram veículos de outros moradores como se fossem dele. Nas residências dormiam netos de Lula no momento do cumprimento dos mandados.
O depoimento de Lula, tomado por dois delegados da Polícia Federal e por dois membros do Ministério Público Federal (MPF), foi marcado por perguntas já respondidas nos três depoimentos anteriores prestados de forma espontânea ao MPF e à PF, sobre questões referentes ao tríplex em Guarujá (SP), ao sítio em Atibaia (SP) e às supostas benfeitorias feitas nesses locais.
Os documentos relativos aos imóveis, dotados de fé pública, indicam quem são os efetivos proprietários. O sítio foi comprado por meio de cheques administrativos emitidos por Fernando Bittar e Jonas Suassuna. Os imóveis estão situados em São Paulo e não possuem qualquer relação com a Justiça Federal do Paraná.
Não havia fato que justificasse a condução coercitiva, pois tudo já fora respondido. Não houve recusa a novo depoimento.
O que ocorreu, inegavelmente, foi um grave atentado à liberdade de locomoção de um ex-presidente da República sem qualquer base legal.
A tentativa de vincular Lula a um “esquema de formação de cartel e corrupção na Petrobras” apenas atende a anseio pessoal das autoridades envolvidas na operação, além de configurar infração de dever funcional, na medida em que a nota emitida pelo MPF antecipou juízo de valor, o que é vedado pelo Conselho Nacional do Ministério Público.
Não se contesta que o respeito devido a Lula é o mesmo que se deve a qualquer outro cidadão brasileiro. Mas, da mesma forma, Lula, como qualquer outro cidadão, não pode ser exposto ao arbítrio e ao prejulgamento. Lula jamais participou ou foi beneficiado por qualquer ato ilegal.
ROBERTO TEIXEIRA, 71, advogado de Lula desde os anos 1980, foi presidente da subseção da OAB - Ordem dos Advogados do Brasil - de São Bernardo do Campo (1981 a 1985) CRISTIANO ZANIN MARTINS, 40, é advogado de Lula
Fonte: Folha de São Paulo