Rio, 20/setembro/2012 – Em uma profilática medida de defesa dos interesses nacionais, o governo da Federação Russa determinou a cessação das atividades da Agência dos Estados Unidos para o Desenvolvimento Internacional (USAID) em seu território. Com a decisão, o escritório da agência terá que fechar as portas até o próximo dia 1º. de outubro, encerrando duas décadas de atividades no país. Segundo o porta-voz do Ministério das Relações Exteriores da Federação, Alexander Lukashevich, a decisão foi tomada pelo governo russo após a conclusão de que a agência proporcionava fundos para organizações não-governamentais (ONGs) que interferir no processo político interno: “Tratam-se de tentativas de influenciar o processo político, inclusive eleições de vários tipos, e as instituições da sociedade civil, por meio da distribuição de doações” (Novosti, 19/09/2012).

Segundo o porta-voz, o governo russo está preocupado com a atuação da USAID em regiões como o Norte do Cáucaso, onde se manifesta uma insurgência islâmica (que tem todas as “credenciais” de estar sendo, em grande medida, insuflada por serviços de inteligência estrangeiros).

Em uma entrevista coletiva, na quinta-feira 20 de setembro, o porta-voz do Kremlin, Dmitry Peskov, não deixou margem a dúvida sobre a origem da decisão, ao afirmar que o presidente Vladimir Putin tem uma “posição idêntica” sobre a atuação da USAID no país (Novosti, 20/09/2012).

Como é notório na Rússia, a USAID é uma das principais financiadoras das ONGs e grupos políticos que fazem oposição sistemática a Putin, encabeçando um aparato intervencionista constituído ainda pela semioficial Fundação Nacional para a Democracia (National Endowment for Democracy-NED) e fundações privadas como a Freedom House e outras – esquema que teve participações decisivas nas chamadas “revoluções coloridas”, na Ucrânia, Geórgia e outros países do antigo bloco soviético, embora o seu sucesso tenha se limitado a Kiev e Tbilisi. Nos 20 anos de operação na Rússia, a agência distribuiu recursos no montante de 2,6 bilhões de dólares a diversas entidades locais, em programas de saúde, meio ambiente e “fortalecimento da sociedade civil”.

A iniciativa do Kremlin se insere no contexto de uma decisão de impor sérias restrições à operação de ONGs que recebam recursos externos, sejam nacionais ou estrangeiras, que, segundo uma lei recentemente aprovada pelo Parlamento russo, terão que registrar-se oficialmente como “agentes estrangeiros” operando no país.

As reações estadunidenses variaram entre a cautelosa e a arrogante, mas deixando claro que a agenda de interferência na Rússia deverá prosseguir, de um jeito ou de outro. A porta-voz do Departamento de Estado, Victoria Nuland, entrou na primeira categoria:

Os EUA receberam recentemente a decisão do governo russo de encerrar as atividades da USAID na Federação Russa… Embora a presença física da USAID chegará ao fim, nós permanecemos comprometidos em apoiar a democracia, os direitos humanos e o desenvolvimento de uma sociedade civil mais robusta na Rússia, e procuraremos continuar a nossa cooperação com ONGs russas (Reuters, 18/09/2012).

Já o Washington Post dedicou uma longa reportagem ao assunto, na edição de 20 de setembro, cujo tom geral foi o de um ataque a Putin, pelos “suspeitos de sempre”:

“Uma clara condenação das ações de Putin é necessária, por princípio e para demonstrar apoio àqueles russos valentes que estão fartos da corrupção rampante, dos abusos e da mão pesada das autoridades”, disse o presidente da Freedom House, David J. Kramer. “O governo dos EUA deveria deixar claro que o apoio permanecerá inalterado para as organizações não-governamentais russas.”

O New York Times (18/09/2012) rotulou a decisão como uma “provocação do Kremlin” e anunciou que ela foi amplamente recebida em Washington “como uma afronta”. O jornal menciona o senador John McCain (republicano-Arizona) como um dos “afrontados”, tendo dito que se tratou de “um insulto aos EUA e um dedo no olho do governo Obama, que tem trombeteado consistentemente o alegado sucesso da sua assim chamada política de reinício com Moscou”.

A iniciativa do Kremlin – e as reações a ela – denotam um entendimento bastante preciso das formas de intervenção estrangeira nos assuntos internos da nação ou, como chamam alguns estrategistas ocidentais, “soft power” (poder suave). Sem querer sugerir que certas nações ao sul do equador tomem medidas semelhantes – afinal, a USAID tem uma longa tradição de atuação nelas -, seria de muito bom alvitre que as autoridades locais prestassem uma atenção maior nas atividades da agência estadunidense.
 

Fonte: Alerta Científico e Ambiental é uma publicação da Capax Dei Editora Ltda.
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