Fonte: Redação do Site Inovação Tecnológica – 12/11/2012
”]Metafísica
Físicos estão propondo um experimento que pode nos obrigar a fazer uma escolha entre explicações radicais para descrever a natureza e o comportamento do Universo.
Explicações muito mais radicais do que a recentemente demonstrada natureza fundamental das partículas quânticas.
Se o resultado do experimento der um cabalístico 7, então o Universo segue as leis da relatividade de Einstein, tudo se move suavemente e a velocidade da luz continuará sendo o limite universal de velocidade – tudo continuará bem familiar.
Mas se o resultado superar o 7 – para ser mais exato, se ele chegar a 7,3 – então não apenas os físicos, mas também os filósofos terão que fazer uma convenção mundial para tentar traçar parâmetros para uma forma totalmente nova de pensar o mundo – e superar a velocidade da luz passaria a ser algo trivial.
Relatividade versus Mecânica Quântica
O experimento visa responder uma questão que desafia os físicos há um século: Qual é a explicação mais fundamental para a natureza do Universo?
Seria a Relatividade, seria a Mecânica Quântica, ou haveria algo mais fundamental por baixo de tudo?
O que Jean-Daniel Bancal e seus colegas agora estão cogitando é que pode não se tratar apenas de uma teoria mais fundamental, “por baixo” de tudo, mas de uma outra realidade, “por baixo” da realidade do nosso próprio Universo.
”]Universo não-local
A Teoria da Relatividade está longe de ser simples, mas, em um campeonato de estranhices, a Mecânica Quântica ganha disparado.
Então, se a natureza quântica do mundo for confirmada, o que isso significaria?
Há duas possibilidades.
A primeira é confrontar a Relatividade de Einstein e aceitar que é possível mover informações, ou o que seja, mais rápido do que a luz.
O problema é que a Relatividade é uma teoria extremamente bem-sucedida, e não é fácil encontrar pesquisadores que a questionem frontalmente. Assim, para muitos físicos, esta seria a possibilidade mais radical.
Mas dificilmente se poderia negar à outra possibilidade de explicação do mundo o adjetivo “radical”.
A opção restante seria aceitar que existe algum processo subjacente – por assim dizer, “fora” do nosso Universo – que tem um efeito sobre o nosso espaço-tempo equivalente a considerar que uma coisa pode afetar outra, independentemente da distância entre elas, em uma velocidade infinita.
Seria o efeito borboleta levado ao extremo dos extremos, no sentido de que alguma coisa poderia afetar outra, em qualquer parte do Universo, não como uma cadeia de acontecimentos sucessivos, mas direta e imediatamente.
Estaríamos então em um Universo marcado pelo que os físicos chamam de “não-localidade”.
Em um Universo não-local, cada pedaço do Universo pode ser conectado a qualquer outro pedaço, em qualquer lugar, instantaneamente – seria algo como a abolição do movimento como fenômeno necessário para interligar dois pontos.
É claro que isso desafia a nosso senso comum sobre a realidade, representando uma outra solução radical.
Mas os físicos afirmam que é preferível aceitar essa opção do que a comunicação a uma velocidade mais rápida do que a da luz, porque então eles não teriam nenhum outro fenômeno, e os experimentos mostram que nem neutrinos superam a velocidade da luz.
“Nosso resultado dá peso à ideia de que as correlações quânticas surgem, de alguma forma, de fora do nosso espaço-tempo, no sentido de que nenhuma história no espaço e no tempo conseguiria descrevê-las,” explicou Nicolas Gisin, da Universidade de Genebra, na Suíça, membro da equipe internacional que está propondo esse desempate entre Relatividade e Mecânica Quântica.
Como explicar o entrelaçamento quântico
O experimento propriamente dito consiste em medir as interações não-locais entre quatro partículas quânticas entrelaçadas.
O entrelaçamento quântico – ou emaranhamento quântico – já está muito bem demonstrado experimentalmente, sendo utilizado, entre outros, na busca pela construção dos computadores quânticos.
Quando duas ou mais partículas ficam entrelaçadas, tudo o que acontecer a uma imediatamente afeta a outra, independentemente da distância que as separe.
E, como isso não é teoria, mas realidade, a questão é como elas fazem isso.
Aqui também há duas possibilidades.
A primeira é que elas “combinariam” de antemão a modificação e, por algum processo desconhecido, saberiam exatamente quando sofrer a alteração. Essa proposta tem sido sistematicamente rejeitada por experimentos que mostram violações da chamada inequalidade de Bell.
A outra opção é que as duas partículas trocariam um “sinal” para que uma soubesse que a outra foi afetada, e alterar-se igualmente.
”]Influências escondidas
O problema é aceitar que esse “sinal” – essencialmente uma informação, que seria usada pela segunda partícula para alterar-se em resposta a uma alteração da primeira – possa viajar mais rápido do que a luz.
Por exemplo, se há mesmo uma troca de sinais, no experimento agora proposto, essa informação teria que viajar mais de 10.000 vezes mais rápido do que a velocidade da luz.
Então a equipe de físicos que propôs o teste embalou junto uma nova teoria: a de que os sinais não seriam informação, mas “influências escondidas” que não seriam usadas para nada – assim, elas não violariam a Teoria da Relatividade.
Se essas influências escondidas existirem de fato, elas poderiam ser deduzidas de um sistema de quatro partículas quânticas entrelaçadas, que estariam conectadas por influências absolutamente fantasmagóricas – de fora do nosso espaço-tempo.
É bom lembrar que Einstein chamou o “mero” entrelaçamento quântico de “ação fantasmagórica à distância” – seria interessante saber como ele chamaria essas influências quânticas escondidas, que seria algo como “úteis, mas inservíveis”.
80 dimensões
Matematicamente, o sistema quântico do experimento proposto é descrito por um objeto de 80 dimensões.
A inequalidade escondida – cujo resultado poderá ser até 7, ou até 7,3 – é o limite da sombra que esse objeto de 80 dimensões projeta sobre 44 dimensões.
O grupo mostrou que as previsões quânticas podem estar fora desse limite, o que significa que elas estariam indo contra um dos pressupostos.
Fora do limite, ou as influências não podem ficar escondidas, ou elas devem ter uma velocidade infinita.
Entrelaçar quatro partículas é algo já feito por vários grupos experimentalistas, o que torna o teste agora proposto viável em um futuro próximo.
Antes, porém, a precisão dos experimentos terá de melhorar para tornar a diferença mensurável.