Esse parece ter sido o sentimento que prevaleceu nos Estados Unidos para a reeleição de Barack Obama. A frustração das grandes expectativas de mudança levantadas quatro anos atrás esfriou os ânimos, mas a ameaça de delírio guerreiro e reacionário representada por Mitt Romney e o Tea Party pesou mais forte. Sobra ainda a esperança de que o segundo mandato de Obama seja melhor do que o primeiro.
Embora amplos setores do campo liberal considerassem os candidatos igualmente ruins, e alguns até preferissem a derrota de Obama, no frigir dos ovos a maioria optou por considerar o atual presidente menos ruim. Significativamente, isto ocorreu em particular entre os jovens, apesar da tendência ao empobrecimento dos trabalhadores e ao desemprego, que afeta mais exatamente aos jovens, como observa Atilio Boron (aqui).
Mas o New York Times, que apoiou Obama, chamou a atenção para o domínio do complexo industrial-militar-de segurança no poder do Estado, contra o qual o presidente Eisenhower tentou em vão alertar o país 50 anos atrás. O editorialista tenta dourar a pílula, omitindo os aspectos mais graves desse “governo encoberto”, mas o que diz é suficiente para perceber a permanência do poder paralelo que torna a nação viciada- dependente da política de guerras sem fim de caráter imperialista.
Robert Parry, no site Consortium News, ilumina aspectos interessantes da mudança no eleitorado que favoreceram a vitória de Obama, entre os quais a tendência mais forte do bloco em expansão de não brancos a votar democrata, que suplanta a tendência mais forte dos brancos, que reduzem cada dia sua importância numérica relativa, a votar republicano.
Não obstante todos os embaraços, tropeços e dubiedades de Obama, há expectativa de que, pelo menos em alguns aspectos, sua política externa no segundo mandato melhore. Desde logo, sua gafe célebre com o primeiro-ministro russo Medvedeiv admite esperar seja amenizada a política de confrontação com a Rússia no campo dos antimísseis. Em outro ponto nodal, a política estadunidense de aliança com Israel para agressão ao Irã, também há motivo para esperar melhoria, como observa MK Bhadrakumar.
O muito aguardado comentário dos iranianos apareceu na edição de 2ª-feira do Tehran Times[1] – sobre como a eleição presidencial nos EUA atinge o Irã. A conclusão: “Romney e Obama discordam em questões como assistência pública à saúde, emprego, orçamento militar e impostos, mas partilham o mesmo ponto de vista no que tenha a ver com prolongar a oposição ao Irã e ao programa nuclear iraniano para finalidades pacíficas. O próximo presidente dos EUA será anunciado dentro de algumas horas; pode-se dizer que qualquer dos candidatos que seja eleito será hostil ao Irã, como todos os presidentes dos EUA que estiveram no cargo desde a vitória da Revolução Islâmica em 1979.”
A avaliação segue linhas previsíveis. Mas, de fato, o que importa no comentário iraniano deve ser lido nas entrelinhas. A principal entrelinha é que o comentário rebate a acusação de Mitt Romney, de que Obama seria “soft” [suave, frouxo] contra o Irã. Dito em outras palavras, o comentário não compromete as credenciais de Obama nem suas chances eleitorais.
Claro: uma vitória de Romney será golpe duro de assimilar para o Irã, e quase com certeza significará o fechamento do canal oculto de contato que parece estar em operação entre Washington e Teerã. Mês passado, o New York Times[2] revelou que há contatos secretos entre Washington e Teerã e que conversações diretas podem começar no instante em que se concluam as eleições presidenciais.
Por falar nisso, um jornal israelense de grande circulação popular, Yedioth Ahronoth publicou matéria na 2ª-feira, em que identifica uma advogada de Chicago, nascida na cidade iraniana de Shiraz e hoje conselheira de Obama, Valerie Jarrett, como peça chave do lado norte-americano nas comunicações com os líderes iranianos em reuniões secretas no Bahrain há vários meses.
Al-Arabiya também noticiou no domingo[3] que o Irã suspendeu o enriquecimento de urânio a 20% como gesto “de boa vontade”, ante a aproximação do início de conversações, dentro do formato P5+1, previsto para o final de novembro. E, isso, logo depois de notícias persistentes de que Ali Akbar Velayati, alto conselheiro do Líder Supremo do Irã Aiatolá Ali Khamenei, tivera reuniões com funcionários da ONU sobre a questão nuclear.
Velayati é figura chave do establishment da política externa do Irã (foi ministro de Relações Exteriores do Irã, por dez anos) e, se o noticiário é verdadeiro, o processo já envolve os líderes iranianos de mais alto nível. É muito possível um acordo que permita ao Irã enriquecer urânio a baixos níveis e sob rigorosa inspeção.
E até Israel já entrou em cena. Há bons sinais, dado que, segundo matérias recentes, funcionários e diplomatas iranianos e israelenses já estão trabalhando em torno da mesa de negociações,[4] em atmosfera de contato entre empresários, longe de qualquer publicidade; o objeto dessas discussões é a eliminação de todas as armas nucleares em todo o Oriente Médio. Nada disso jamais aconteceria, se o governo Obama não tivesse oferecido forte encorajamento.
Um acordo com o Irã[5] poderia fazer do segundo mandato de Obama algo realmente novo e transformador, não só em termos de desarmar um ponto potencial de conflito altamente perigoso para a segurança internacional, mas, também, em termos de pôr sobre novas bases as relações entre os EUA e o Oriente Médio Muçulmano. E, se o processo levar a uma conferência internacional para que se estabeleça uma zona livre de armas de destruição em massa no Oriente Médio, será passo significativo na direção de implementar a agenda de não proliferação nuclear, que Obama sempre acalentou como possível legado de seu governo.
Fonte: http://revistamirante.wordpress.com/2012/11/09/obama-ruim-com-ele-pior-contra-ele/