por: Ailton Benedito de Sousa

Há fatos que deviam ferir a consciência ou a atenção de todos, mas que não fazem porque gozam da capacidade de serem socialmente inconfiguráveis pelo pensamento. Opondo-se a fenômeno, o pessoal da filosofia tradicional, dita grega, nos dá o númeno…O primeiro é todo conhecimento, conteúdo da mente, captado/criado a partir dos receptores sensoriais. Já o númeno, dir-se-ia, é o conhecimento que se posta lá dentro da mente, independente da chancela ou permissão dos sentidos. Exemplo: a noção de direção que o Self dá ao próprio corpo quando num ponto do espaço: – a frente e a retaguarda; o lado de cá, o lado de lá ou mais precisamente Norte Sul Leste Oeste.

O de que se quer falar ultrapassa essas marcações – fenômeno/númeno, embora mais tenha a ver com o fenômeno. Ou seja, são quase-fenômenos (já que ferem nossos sentidos em “sentido” próprio e figurado) para cuja captura e configuração a “mente social” não tem meios, instrumentos para formular, controlar ou subsumir…Preste bem a atenção: não é dado à mente social rol de instrumentos para que opere a captura ou compreensão da “coisa”.

Individualmente, a coisa pode até ser vista, batizada, gerando ou não ação-reação, mas socialmente é “tida” como um oco, geralmente tão claro-ofuscante quanto o disco solar.
Bem, um adendo: sem querer, foi introduzida aqui a expressão/conceito “mente social”, o que nos força dizer que para a captura desses quase-fenômenos o autor admite algo como um “númeno”: aqui especificado como conceito construído pela própria mente. Assim, para o autor a mente, órgão eminentemente individual, mas de expressão social, secreta ou melhor excreta fluxos ou redes de signos…Se se quiser mais largamente, secreta redes de “entes” de substância imaterial (significados), produto de tecitura/tecelagem sígnica.

Mas ocorre que a mente só pode secretar ou excretar essa ou aquela substância sígnica, que tenha sentido/significado se…ela por necessidade só puder se constituir, ser entendida, a partir do/s Outro/s.

Num ponto x do ambiente/tempo, um Self, digamos Luísa, nossa Mãe Africana, orientou-se diante dos filhos que lhe herdaram a capacidade simbólica, produzindo sons/gestos que intentam ter significado: “Lado em que o Sol nasce, Oeste; lado em que morre, Leste; à frente, Norte; atrás, Sul.” É essa seqüência de sons/gestos/sinais e sua tradução no Self de cada qual “como instrumento para orientar a ação-reação-práxis no mundo que chamei de rede de entes de substância imaterial…Aí estão a Língua e as possíveis Linguagens…Aí está o Humano, o absolutamente Humano – o Um em Todos, ou o Todos em Um…Aí está a Sociedade, o Grupo Humano…Aí estão Tempo e Espaço como contingências estruturantes, logo aí está a Memória, o arquivo do Self, aí está a Cultura, aí estão as Formas e os Valores….Porque se no Sul houver, consabidamente, um Deserto, então o Sul é o Mal e o Norte poderá ser um Bem…Quem estava/está no interior dessa rede de signos e consequentemente elabora sua tradução, define sua pertinência ao mundo humano, ao mundo simbólico, independente de cor, porque raça só pode haver uma… Penso então ter dado significado à expressão “mente social”.

Luisa criou, educou os filhos, ela mesma suprindo todos os instrumentos para tal… A Humanidade, hoje 6 bilhões e tantos de filhos, para fazer o que Luisa fez sozinha, carece de meios/instrumentos como línguas e linguagens, seus produtos (códigos, narrativas, peças, objetos) e seus arquivos.

Como ela era a expressão absoluta da precariedade, tudo que Luisa fez/fazia por nós tem que ser visto como Bem, pois Mal seria aquilo que pusesse em risco a nossa sobrevivência…Superado o estado de carência crônica, entrada essa Humanidade na era da Abundância e do Desperdício, nem tudo que essa Humanidade nos faz ou possa nos fazer pode receber a classificação de Bem, ao contrário, ela hoje é o Mal. Helicópteros da Onu (digna representante desta humanidade) bombardearam a sede de governo de uma nação africana…

É a encarnação do Mal, nossa sociedade, quando esconde, como agora, os meios para que seus filhos, num país-continente como o Brasil, tenham capacidade para classificar como um CRIME e punir, um ROUBO – o Golpe em curso. Um menino de rua negro rouba um pão ou uma bolsa: é amarrado a um poste e linchado à vista de agentes da polícia estatal, que admite não dever impedir a punição do ladrão-criança, já que “bandido bom é bandido Morto”. Será recolhido a uma casa de custódia e no devido tempo sentenciado pela Justiça ou assassinado pela Polícia.

Um bando de delinqüentes, na medida em que todos, me refiro ao núcleo-duro, têm registro de violação à incolumidade das normas que gerem o tesouro da nação, rouba, esse bando, rouba para si (para sis mesmos, e para os de foras, permitam-me) não só um bem, um objeto de valor avaliável em trilhões segundo uma moeda qualquer, mas todo o CONTINENTE onde estão essa e TODAS AS RIQUEZAS, inclusive os 206 milhões de seres humanos, ANTES POR LEI SUPREMA DEFERIDAS RIQUEZAS DA NAÇÃO. E ninguém vê.

E cientes da imensurável ingenuidade dos súbditos subcidadãos (produzidos pelas fezes simbólicas “excretadas” pelo sistema de televisão e escola) TODOS os ladrões, praticamente sem exceção, DIZEM FAZÊ-LO EM NOME DE DEUS..