Roberto Amaral: "Gostaria de ter mais lideranças, mas, no momento, só temos essa liderança (Lula)"

Roberto Amaral: “Gostaria de ter mais lideranças, mas, no momento, só temos essa liderança (Lula)”

Em entrevista ao O POVO, o ex-presidente nacional do PSB analisa a crise política no País e critica o atual nível de intolerância. Sobre o ex-presidente Lula, afirma que “no momento, só temos essa liderança”

O ex-presidente nacional do PSB, Roberto Amaral, veio a Fortaleza para tentar articular a presença de uma frente ampla nacional para combater o que ele chama de “onda de intolerância” no País. Durante o encontro com O POVO, o ex-ministro de Ciência e Tecnologia da gestão Lula falou sobre a crise política no Brasil.

“Não temos precedentes desse nível de violência e intolerância que estamos vivemos. Não aconteceu nem em 1954, nem 1964”, afirma. Segundo Amaral, a frente é apartidária e popular e deve reunir movimentos sociais de várias vertentes. Ele conta que se reuniu com acadêmicos e sindicatos na Capital cearense para buscar apoio.

Amaral explica que o movimento tem como princípios garantir a soberania do País, os direitos dos trabalhadores e o aprofundamento da democracia. Apesar do racha entre PSB e PT após o lançamento da candidatura de Eduardo Campos à Presidência da República, ele afirma que segue com boa relação com todos os partidos de esquerda.

Para ele, Lula ainda é a “maior liderança popular” atualmente. Ele também se diz preocupado com o mandato de Dilma e garante que a frente vai lutar para que ela o conclua.

Livro

Ainda sobre o tema, Amaral publica o livro A serpente sem casca: Da ‘crise’ à Frente Popular. O lançamento em Fortaleza deve ser feito em agosto, em local ainda a ser definido. Na obra, Amaral reflete sobre o surgimento de um movimento “fascista” no Brasil moderno. Confira detalhes da entrevista com o político:

O POVO – Como avalia a declaração do presidente da Câmara, Eduardo Cunha (PMDB), de ter se tornado oposição ao governo?

Roberto Amaral – Ele já fazia oposição ao governo. Essa decisão torna ilegítima a presença dele na presidência (da Câmara). Nenhum presidente de um poder pode declarar oposição ao outro. Imagina que o presidente do Supremo declarasse oposição ao Congresso? É uma atitude irresponsável. O que está em jogo não é ele ou a presidente, mas sim o País. O governo não tem influência sob a Procuradoria (Geral da República).

O POVO – De que maneira o Brasil pode sair da atual crise moral e política?

Roberto Amaral – Acho que estamos vivendo um bom momento de apuração de irregularidades. Mas a crise moral só se acaba quando erradicarmos a impunidade. Já a crise política é bem mais profunda. Um dos ingredientes para ela é a falência do sistema de partidos. É ingovernável um país com 32 partidos no Congresso. A legislação eleitoral viabiliza a criação desses partidos. Tornou-se um negócio, nas eleições, vender tempo de televisão.

O POVO – E sobre o financiamento de campanha? Quais os outros tópicos deveriam ter destaque da reforma política?

Roberto Amaral – Sou a favor do financiamento público exclusivo. O custo de campanhas deve ser reduzido. Quanto mais alto o custo, mais corrupção. Hoje, 50% ou mais, nós devemos à televisão. Não é horário gratuito porque o povo paga. Grátis é somente a veiculação pelo partido. Seria interessante limitar o número de reeleições para parlamentares, para três, por exemplo. Também acho que parlamentares deveriam renunciar para ocupar cargos no Executivo, como ocorre nos Estados Unidos.

O POVO – De que forma seria possível reduzir custos nas eleições?

Roberto Amaral – Quem comanda as campanhas são os marqueteiros que entendem de vender sabão, mas não entendem de processos políticos, e ainda ganham uma fortuna. Você reduz gastos proibindo, na prestação de contas, parecer de pagamento a marqueteiro e de pesquisa de opinião. Você reduz profundamente custos se passar a fazer programas ao vivo. Programas deveriam ser ao vivo apenas com o candidato defendendo suas ideias.

O POVO – Qual sua visão sobre a bandeira que defende a redução do número de ministérios?

Roberto Amaral – Isso é irrelevante. Não onera porque não gera cargos. É como fazer economia orçamentária diminuindo o café.

O POVO – De onde vem o ódio à presidente Dilma Rousseff (PT)?

Roberto Amaral – Minha avaliação é que setores mais à esquerda e liberais viram uma ameaça na ascensão de direita simbolizada no Aécio Neves (PSDB). Havia um grupo de descontentes que pensavam em votar na Marina Silva (PSB) ou anular o voto. Essas pessoas deram a diferença para que a presidente ganhasse a eleição. Ela está fazendo um governo em contradição com os interesses desses eleitores. No fim das contas, ela nem conta com o capital financeiro (bancos e meios de comunicação), nem com o apoio dos trabalhadores que estão assustados com os ajustes fiscais.

O POVO – Que alternativa haveria para o ajuste fiscal?

Roberto Amaral – O ajuste poderia ter vindo associado à tributação das grandes fortunas e das heranças. Podia ser ligado a uma revisão do imposto de renda, diminuindo a contribuição dos que ganham menos e aumentando muito o imposto dos que ganham mais. Assim, teria contemplado os interesses de toda a sociedade. São medidas que ajudariam a economia e a população.

O POVO – O ex-presidente Lula chegou a dizer que estava no “volume morto”. Como se enxerga o Lula de hoje?

Roberto Amaral – Considero ainda hoje o Lula a maior liderança popular do País. Gostaria de ter mais lideranças, mas, no momento, só temos essa liderança.

O POVO – A presidente Dilma disse que não acredita em delatores, mesmo sustentando que tem incentivado as ações da Polícia Federal e Ministério Publico.Como se deve interpretar essa declaração?

Roberto Amaral – Dilma é uma das poucas pessoas que podem dizer isso. Ela foi para o pau de arara e não abriu o bico. Delatar naquela ocasião era consequência da tortura. Mas agora virou uma chantagem. O acusado tem uma delação premiada, com redução da pena. Portanto, isso é um negócio sujo, que está sendo usado de forma aética. É preciso cortar os limites. Já desde algum tempo as prisões são factoides. Há a condenação da opinião pública.