Com cerca de 600 pessoas, entre parlamentares e representantes de organizações civis, setor privado, acadêmicos, sindicalistas, movimentos sociais e profissionais, o Clube de Engenharia recebeu nesta segunda-feira, 2 de outubro, o lançamento da Frente Parlamentar Mista em Defesa da Soberania Nacional. Pauta histórica da Casa, a soberania nacional tem figurado em debates nacionais em curso em todo o país tendo como questão central as graves ameaças que atingem diretamente a soberania da nação brasileira. Criada com a participação de 18 senadores e 201 deputados federais de diversos partidos, a Frente Parlamentar em Defesa da Soberania Nacional tem como presidente o senador Roberto Requião (PMDB/PR) e como secretário-geral o deputado Patrus Ananias (PT/MG).
“A organização dessa Frente Parlamentar é um capítulo de um processo antigo, e ela é de todos nós. O Brasil é grande demais para não ter projeto próprio e ficar atrelado ao projeto geopolítico de outros países”, disse o senador Roberto Requião. O presidente da Frente Parlamentar fez um retrospecto da composição geopolítica mundial a partir da Segunda Guerra Mundial, passando pela disputa entre EUA e União Soviética na Guerra Fria e, nos anos 1990, a ascensão do neoliberalismo e do capital financeiro, ”que afastaram o ideal de Estado de Bem-Estar Social da Europa e os ideais nacionalistas no Brasil”. Para o senador, existe um desmonte sistemático das políticas de soberania nacional no Brasil que fortalecem o capital financeiro global, colocando o país em posição vulnerável em relação ao domínio econômico da Europa e dos EUA. “O projeto dessa Frente é aberto, e pretendendo abrir espaço para um projeto nacional que consiga, através do convencimento das pessoas e da mobilização, fazer a mudança da economia e nos objetivos nacionais permanentes do país. Estamos abertos a todos os grupos e partidos, em busca de unidade”, garantiu Requião.
O Brasil se desenvolve a partir de suas potencialidades
“O Clube de Engenharia tem a honra de receber parlamentares corajosos que ousam enfrentar o processo de desmonte de conquistas que já datam de oito décadas nos campos econômico, político e social”, disse Pedro Celestino, presidente do Clube de Engenharia, na abertura do evento. “É um retrocesso jamais visto em nossa história, que para ser estancado deverá mobilizar toda a sociedade brasileira, independentemente de crenças, partidos políticos e classes sociais. É a luta pela sobrevivência do nosso país como nação independente. A hora é essa! E saindo daqui temos de começar a mobilizar e unir as pessoas. Contem com o Clube de Engenharia como trincheira em defesa de nossa sociedade, nossa democracia e nossa soberania”, afirmou Celestino.
“País soberano é o país que cuida de sua gente”, disse o deputado federal Patrus Ananias, citando frase que ouviu de uma liderança quilombola em Brasília e enumerando críticas à Emenda Constitucional 95, do “Teto de gastos”, à Reforma Trabalhista e à privatização do Sistema Eletrobras. “Energia elétrica não é um bem de mercado, mas uma questão fundamental para o exercício da cidadania e para garantir a dignidade humana”, afirmou. “Querem passar a ideia de que o país se desenvolve abrindo tudo para o capital estrangeiro. Não é verdade. O Brasil se desenvolve a partir de suas potencialidades locais e regionais, valorizando seus recursos, formando empreendedores, estimulando o cooperativismo e a economia solidária. Queremos um país que cresça a partir de nossas potencialidades”, defendeu o parlamentar.
Em defesa do direito básico da cidadania
“Podemos ter projetos políticos diferentes, mas temos de estar juntos na resistência contra essa série de desmontes”, garantiu o deputado federal Glauber Rocha (PSOL/RJ), lembrando que o movimento contra a Reforma da Previdência conseguiu levar o debate para o dia a dia da população, ajudando a frear seu avanço no Congresso Nacional. A deputada federal Jandira Feghali (PCdoB/RJ) também questionou a privatização do Sistema Eletrobras. “O mundo inteiro estatiza o setor elétrico, mas por aqui querem privatizar”, criticou. “Nacionalismo só combina com democracia, com saídas democráticas e soberania nacional. Nosso papel hoje é formar opinião para além de nós, e afirmar que a soberania nacional é a defesa do direito básico da cidadania. O que construímos até hoje foi com a inteligência brasileira e é patrimônio brasileiro”, disse a parlamentar.
A senadora Gleisi Hoffman (PT/PR) e os deputados federais Wadih Damous (PT/RJ) e Benedita da Silva(PT/RJ) reforçaram o caráter social do momento político que o país vive. “Não pensávamos que ia haver retrocessos tão grandes depois de tanta luta, depois da Constituição Cidadã de 1988, por um governo que não tem nenhum compromisso com o Brasil. Não existe soberania nacional sem soberania popular, com o povo vivendo em condições dignas”, criticou Gleisi. “Para quem pede uma intervenção militar, nós fazemos uma intervenção popular”, conclamou Wadih. Já Benedita da Silva lembrou da importância de atrelar a discussão à defesa dos direitos das mulheres e a luta contra o racismo.
O papel das universidades, da ciência e da pesquisa e extensão acadêmicas esteve presente na fala do deputado federal Celso Pansera (PMDB/RJ). “Não existe soberania nacional, democracia e construção de um Estado moderno se não tivermos o mínimo de domínio sobre o conhecimento e sobre o que se produz no país. O orçamento de Ciência e Tecnologia desse ano, após cortes, voltou a números relativos a 2003”, alertou o parlamentar, citando pesquisas, como as sobre o zica vírus, que só foram possíveis com investimento público em ciência e tecnologia.
O senador Lindbergh Farias (PT/RJ) parabenizou o papel protagonista que o Clube de Engenharia tem assumido na pauta em defesa da soberania nacional e lembrou que o lançamento da Frente Parlamentar se deu no dia anterior à comemoração dos 64 anos de criação da Petrobras. “Não pensem que foi fácil criar a Petrobras. O debate é o mesmo que temos hoje, inclusive na mídia”, disse, lendo textos da imprensa da época que criticaram a nacionalização do petróleo. O senador alertou para o fim da política de conteúdo local que, segundo ele, afeta diretamente a geração de empregos e o desenvolvimento da indústria de petróleo e gás no país.
O Manifesto pela Soberania Nacional, marco da fundação da Frente e endossado pelo Clube de Engenharia, coloca a soberania, inscrita no artigo 1º da Constituição Federal, no centro do debate que busca promover o desenvolvimento do país, um direito que não pode ser limitado por “políticas ocasionais que a comprometam e que dificultem a autodeterminação do Brasil e de sua capacidade de resistir a tentativas de interferência externa”. São eixos de ação da Frente Parlamentar a defesa: da exploração eficiente dos recursos naturais, entre eles o petróleo, para a promoção do desenvolvimento; da construção de uma infraestrutura capaz de promover o desenvolvimento; da contribuição da agricultura para a alimentação do povo e as exportações; do capital produtivo nacional e de um sistema de crédito que tenha como objetivo seu fortalecimento; do emprego e do salário do trabalhador brasileiro; de um sistema tributário mais justo; de Forças Armadas capazes de defender nossa soberania; e de uma política externa independente. Para ler o manifesto na íntegra, clique aqui.
Presenças ilustres
Participaram do lançamento da Frente Parlamentar Mista em Defesa da Soberania Nacional além dos senadores e deputados federais, numerosos deputados estaduais e vereadores, o embaixador e ex-ministro da Defesa e das Relações Exteriores Celso Amorim, o ex-senador e conselheiro do Clube de Engenharia Roberto Saturnino Braga, o deputado Chico Alencar (PSOL/RJ), o professor e diretor de Relações Institucionais da COPPE/UFRJ Luiz Pinguelli Rosa, o cientista político e ex-ministro Roberto Amaral, o cineasta Luiz Carlos Barreto e representantes da Federação Interestadual de Sindicatos de Engenheiros (Fisenge), a Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC), a Federação Única dos Petroleiros (FUP), o Conselho Regional de Engenharia e Agronomia do Rio de Janeiro (CREA-RJ), a Associação de Funcionários do BNDES (AFBNDES) e a Associação Brasileira das Indústrias de Química Fina (Abifina). Estiveram presentes, ainda, o Sindicato dos Metalúrgicos do Rio de Janeiro, Sindicato dos Engenheiros no Estado do Rio de Janeiro (Senge-RJ), Sindipetro Norte Fluminense, Sindicato dos Médicos do Rio de Janeiro (SindMed-RJ) e Sindicato dos Bancários. Os movimentos sociais foram representados, entre outros, pela Frente Brasil Popular, movimento Auditoria Cidadã da Dívida, União Estadual dos Estudantes do Rio de Janeiro (UEE-RJ), Frente Povo Sem Medo e Movimento dos Atingidos por Barragens (MAB).