São Paulo, 01/07/2015 – Afastado da direção do partido após decidir apoiar a reeleição de Dilma Rousseff, o ex-presidente do PSB Roberto Amaral disse em entrevista ao Broadcast Político ver claramente um uso político da Polícia Federal nas investigações da operação Lava Jato. “Tem alguma inteligência articulando isso (os vazamentos dos conteúdos das delações). Isso prejudica o País”, afirmou.

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Amaral cita a forma e as datas em que as informações são vazadas como evidências da manipulação política. Ele questiona, por exemplo, o vazamento da delação de Ricardo Pessoa, da UTC, que implicou dois ministros – Aloizio Mercadante (Casa Civil) e Edinho Silva (Comunicação Social) – às vésperas da viagem de Dilma para os Estados Unidos, uma possível agenda positiva para o Planalto. E critica o fato de apenas as doações a petistas estarem no foco dos vazamentos. “A diferença da declaração de campanha entre Aécio (Neves) e Dilma é mínima. Agora, de um lado tem a suposição da ilicitude e do outro, não.”

O socialista pondera, no entanto, que o governo não pode adotar o discurso “suicida” de criticar a PF, pois é uma instituição que precisa ter respeitada sua independência. A solução, para ele, seria haver uma fiscalização de possíveis abusos e responsabilização. “Tinha que haver um instituto legal para impedir isso, para responsabilizar”, avaliou.

Frente Popular

Amaral articula com outras forças políticas – incluindo petistas como o ex-governador do Rio Grande do Sul Tarso Genro – uma frente que chama de “popular e democrática”. O intuito é fazer uma mobilização social sem um foco eleitoral, segundo Amaral. O movimento surge no Rio de Janeiro, onde teve um primeiro evento formal nesta semana, e pretende se espalhar pelo País. “A gente tem que agir antes da eleição, como na erupção de 2013”, disse, referindo-se às manifestações de rua que sacudiram o Brasil naquele ano.

“Nosso objetivo estratégico é tentar barrar o avanço da direita”, diz o dirigente. Amaral é uma das vozes críticas ao atual Congresso Nacional, que chama de “reacionário”. “É um Congresso ordinário – não constituinte – que está reescrevendo a Constituição, querendo reduzir a maioridade penal, mudar a demarcação das terras indígenas, alterando direitos trabalhistas, estatuto da família, discussão de gênero, fazendo campanha pelo armamento e que quer ainda constitucionalizar a corrupção”, criticou, fazendo referência à PEC aprovada na Câmara que legaliza a doação empresarial a partidos políticos. Amaral chama o presidente atual da Casa, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), de “sátrapa”, uma espécie de déspota que tenta impor um “parlamentarismo fraco” ao País.

Amaral disse que um dos principais temas da frente popular que tenta emplacar é como evitar o avanço de concepções reacionárias que, na visão da movimento, podem ter um impacto nefasto sobre a economia do País. Segundo o relato do socialista, cerca de 200 pessoas participaram do lançamento da Frente, no Clube de Engenharia do Rio, entre representantes de movimentos sociais e do empresariado.

“Um dos nossos temas foi a defesa da engenharia nacional. Você bota o Marcelo Odebrecht na cadeia, tritura quem você quiser – acho inclusive um avanço extraordinário estarmos punindo essas pessoas. Agora, se destruir as dez maiores empresas brasileiras, que têm know-how no pré-sal, na engenharia, na infraestrutura, você destrói o País.” Para Amaral, criar esse “buraco” só interessa ao capital estrangeiro, “a começar pelos chineses, que estão aí na porta esperando para fazer aqui o que fizeram na África”. “Nós temos que, quando jogar fora a água do parto, não jogar o bebê”, defendeu.

Amaral diz até que, se fosse presidente, pensaria em uma forma de intervir nas empresas investigadas, afastar a direção para “limpar e regularizar” e devolver depois ao mercado, usando como base o mecanismo de intervenção do Banco Central sobre instituições financeiras.

Governo

Amaral tem um alinhamento político em relação ao governo Dilma semelhante ao de centrais sindicais e movimentos sociais. Assume uma postura crítica ao ajuste fiscal, mas não aceita a linha oposicionista que caminha para o pedido de impeachment da presidente. “Não vou além (dessa postura crítica) porque não acho que devo. Ir além é defender o golpe. A questão fundamental é a governança. Não é só pela Dilma, não. Este país precisa, o empresariado brasileiro precisa realizar seus lucros. Mantido esse clima por mais alguns meses, nem o empresariado nacional nem o estrangeiro investe.”

O socialista evita críticas diretas à condução política do governo, mas admite as evidentes dificuldades, chegando a classificar como “esquizofrenia” o governo puxar pelo ajuste de um lado e o Congresso puxar pelo aumento de gastos do outro. Próximo a Lula, de quem foi ministro da Ciência e Tecnologia, ele aponta um erro do ex-presidente e do PT ao direcionar os principais expoentes da legenda para a esfera do governo – além dos quadros que foram afastados do partido por conta do mensalão, como José Dirceu e João Paulo Cunha. Para Amaral, isso criou um “vácuo de ação” política e ideológica no PT que afetou profundamente o governo Dilma.

Amaral não fala abertamente sobre sua possível saída do PSB, apenas admite que sua situação na legenda é difícil e não tem qualquer relacionamento com a direção. Recentemente, Amaral contrariou orientação do partido e aceitou um cargo ligado ao governo federal – de conselheiro da Itaipu. (Ana Fernandes e Valmar Hupsel Filho)