por: Jorge Werthein
Publicado no O Globo, dia 17/08/2014
Sem ênfase na educação, é praticamente impossível atingir Objetivos do Milênio
Aproximadamente 57 milhões de crianças estão fora da escola em todo o planeta. Esse número pode não assustar quem lembra que há cerca de sete bilhões de habitantes no mundo, mas deveria preocupar — e muito.
Os motivos, tão evidentes quanto frequentemente esquecidos, são de ordem individual e coletiva. Do ponto de vista coletivo, está provado que a educação de qualidade ao longo de toda a vida é uma das bases — se não a principal — para o desenvolvimento econômico-social sustentável. Dela derivam numerosos benefícios coletivos, como equidade, coesão e justiça sociais; consciência cívica e ambiental; saúde e segurança públicas etc. Do ponto de vista individual, a educação favorece o crescimento pessoal e profissional, a capacidade produtiva, a criatividade, o discernimento, o bem-estar. Naturalmente, ambos os aspectos (coletivo e individual) complementam-se.
No ano 2000, a Organização das Nações Unidas estabeleceu os oito Objetivos do Desenvolvimento do Milênio (ODM): 1 – Reduzir a pobreza; 2 – Alcançar a educação básica universal; 3 – Garantir a igualdade entre os sexos e a autonomia das mulheres; 4 – Reduzir a mortalidade infantil; 5 – Melhorar a saúde materna; 6 – Combater o HIV/Aids, a malária e outras doenças; 7 – Garantir a sustentabilidade ambiental; 8 – Estabelecer uma parceria mundial pelo desenvolvimento. No entanto, sem a devida ênfase na educação, é praticamente impossível atingir os demais objetivos.
O ano de 2015 é a data-limite para que as 189 nações que assinaram o Compromisso do Milênio junto à ONU cumpram-no. No que diz respeito à educação, nações desenvolvidas ou em desenvolvimento estão diante da responsabilidade de melhorar ou manter a qualidade do ensino e do aprendizado (o acesso à educação já não basta); reduzir ou erradicar a evasão escolar (ingressar na escola é insuficiente); valorizar, qualificar e estimular os professores continuamente; garantir a segurança e a saúde física e mental dos estudantes no ambiente escolar; preparar professores e estudantes para as constantes e céleres transformações no planeta, sobretudo em ciência e tecnologia.
Evidentemente, há milhares de pessoas no mundo refletindo e debatendo caminhos para a educação: a própria ONU, governos, programas (como Educate a Child), universidades, empresas, organizações não governamentais, indivíduos. Parece haver consenso em torno da relevância da educação de qualidade para todos ao longo de toda a vida.
Restam, agora, vontade política e ações concretas nos países menos desenvolvidos. Os desenvolvidos e em desenvolvimento, por sua vez, não devem contentar-se com vantagens estatísticas apenas. É preciso pensar nas pessoas por trás dos números. Enquanto houver quantidade tão significativa de crianças fora da escola, com tudo o que isso representa coletiva e individualmente, só parte da missão estará cumprida. Quando se trata de educação, é preciso seguir em frente e lidar com a incômoda, mas necessária, noção de infinito.
Jorge Werthein é sociólogo e foi representante da Unesco no Brasil e nos Estados Unidos
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