Cientista político, ex-presidente do PSB, fala sobre eleitorado paulista e impasse político

Jornal do Brasil 

Os protestos do dia 15 contra o governo da presidente Dilma Rousseff tiveram mais força em São Paulo, cidade que tem uma já antiga tradição conservadora, conforme destacou Roberto Amaral, cientista político, ex-ministro da Ciência e Tecnologia e ex-presidente do PSB, em conversa com o JB por telefone. A cidade, ele completa, também tem uma tradição anti-getulista, provinciana. Apresenta, contudo, um papel pendular, vide a eleição do petista Fernando Haddad, que derrotou o tucano José Serra em 2012. Para Amaral, o país está agora em um “‘parlamentarismo branco'”, em que os presidentes do Senado e da Câmara atuam como primeiros-ministros virtuais.

“Ele (São Paulo) é tão grande em si, que não tem como ver a nacionalidade. Isso ficou claro no episódio de 1932”, destaca Amaral. São Paulo pegou em armas na Revolução Constitucionalista daquele ano, para expressar sua insatisfação com a Revolução de 1930, que queria a mudança de tudo que São Paulo representava, como base da política da República Velha e do sistema oligárquico.

Durante as eleições de outubro, o candidato Aécio Neves somou 4,1 milhões de votos na capital paulista e 15 milhões em todo o estado. Dilma teve quase a metade disso, 8 milhões de votos. Dois anos antes, contudo, o PT teve vitória na cidade, com a eleição de Fernando Haddad para a prefeitura, lembra Roberto Amaral. Haddad venceu ninguém menos que José Serra, tucano, ex-governador de São Paulo, ex-ministro, ex-prefeito, ex-candidato à presidente. São Paulo assume, então, um papel muito pendular, explica Amaral.

“A árvore não deve ser tomada como o bosque. Eu atribuo tudo isso como o alimento dessas manifestações, mas eu penso que há um fator aglutinador, e esse fator chama-se PT. Ele atraiu para si a imagem de tudo aquilo que o homem comum detesta na política, ele é a Geni, ele é responsável pela inflação, é responsável pelos erros do Haddad, pelos erros dos seus e pelos erros dos outros. A disfunção da República é atribuída ao PT, a corrupção no país é atribuída ao PT, as dificuldades de mobilidade, a situação dos estudantes, as dificuldades para conseguir emprego, a falta d’ água, tudo é atribuído ao governo e o governo é reduzido ao PT. Isso é um desafio que o PT terá que enfrentar”, analisa o cientista político.

Na opinião de Amaral, o PT deveria ter feito, logo após a eleição, uma reflexão sobre as causas desse movimento, mas “parece que não fez”. São Paulo tem uma base conservadora, uma base popular/progressista e a classe média. A conservadora, explica Amaral, é bem maior que a progressista, que tende a diminuir “na medida que o proletariado diminui por força do desenvolvimento do grande capital e na medida que o PT e suas forças se distanciam da classe média”.

“Houve uma coisa no país, que eu posso chamar de golpe ou não, houve uma mudança de regime sem mudança constitucional e sem tanque. O país está num ‘parlamentarismo branco’, que não é aquele clássico, como o imposto ao Jango, mas é fático. O Congresso está decidindo a administração, decidindo a pauta, e os presidentes da Câmara e do Senado estão funcionando como virtuais primeiros-ministros”, resume Roberto Amaral.

Segundo Amaral, esta situação pode ser tanto uma alternativa para crise, como pode ser o agravamento, porque o Congresso tanto pode avançar no ajuste fiscal que o governo coloca como necessário, como pode impedi-lo, levando o país para um “impasse”.